Aspectos da Execução de Cotas Condominiais

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I) Introdução

Antes de entrar em alguns dos aspectos que permeiam uma Ação de Execução de Cotas Condominiais, este artigo faz uma breve introdução de um dos desafios da gestão de condomínio residencial no que se refere a inadimplência. Tenta para tanto buscar uma reflexão dos operadores do direito do quanto é importante tentar se esquivar de ações judiciais que se prolongam nas tramitações dos tribunais e comprometer assim a gestão no condomínio.

Traz também uma realidade que é o fato de que nem sempre se consegue sucesso em acordos extrajudiciais e nestes casos então, necessário se faz ingressar com ações judiciais.

Não se pretende esgotar aqui todos os temas que envolvem uma ação de execução de cotas condominiais, mas buscar de forma prática um olhar aos pontos que se precisa estar atento para uma ação com menor prazo possível na tramitação judicial.

Os temas abordados são, além dos desafios da gestão de condomínio residencial, também atribuição do síndico quanto a cobrança de taxas condominiais, ação de execução e seus requisitos, cotas vincendas, multas por descumprimento de normas do condomínio em ação de execução, imóveis gravados com garantia de alienação fiduciária, execução no juizado especial cível e por fim uma rápida conclusão.

II) Desafios da Gestão de Condomínio Residencial

A inadimplência sempre foi um dos grandes e maiores desafios da gestão condominial, ressaltando que durante a pandemia essa situação se agravou.

Diante desse problema, que pode comprometer a gestão financeira do condomínio, o síndico deve dar atenção especial para esse evento e assim evitar as consequências de uma má gestão.

Por essas razões, a eficiência e a agilidade na cobrança são extremamente importantes, pois só assim o síndico poderá chegar o mais próximo do equilíbrio financeiro tão difícil de ser alcançado.

III) Atribuição do Síndico e Ação de Execução

O síndico tem várias atribuições esculpidas no Código Civil, e dentre elas está a de realizar cobranças dos condôminos inadimplentes. Em seu artigo 1.348, inciso VII, o CC/02 traz de forma cristalina a obrigação da cobrança, assim como impor e cobrar as multas devidas.

Art. 1.348 – Compete ao síndico:

VII – cobrar dos condôminos as suas contribuições, bem como impor e cobrar as multas devidas;

Importante destacar que anistiar taxa condominial e/ou multas, pode trazer consequências jurídicas ao síndico. (Em outro artigo irei aprofundar nas consequências dessa atitude do síndico e de como se pode realizar anistia de multas).

Iniciar a cobrança por via extrajudicial será sempre a melhor opção, uma vez tratar-se de procedimento barato e célere, pois não fica se prolongando nos trâmites judiciais.

Entretanto, quando essa negociação não se materializa, não resta outra alternativa senão o processo judicial e este pode ser uma ação de cobrança ou uma ação de execução de título executivo extrajudicial.

A ação de cobrança é um procedimento judicial muito moroso e desgastante para o condomínio. Logo, optar pela ação de execução é mais benéfico.

Com advento do CPC de 2015 as cotas condominiais passaram a fazer parte do rol de título executivo, permitindo, portanto, o ajuizamento de execução para despesas condominiais.

Art. 784. São títulos executivos extrajudiciais:

X – O crédito referente as contribuições ordinárias ou extraordinárias de condomínio edilício, previstas na respectiva convenção ou aprovadas em assembleia geral, desde que documentalmente comprovadas;

Para que essas cotas condominiais em atraso tenham força de título executivo é preciso observar alguns requisitos dispostos no artigo 783 do CPC, quais sejam:

Art. 783. A execução para cobrança de crédito fundar-se-á sempre em título de obrigação certa, líquida e exigível.

Certeza: não ter nenhuma dúvida a respeito de sua validade, e para tanto o documento de aprovação do rateio da cota condominial é imprescindível na instrução processual (convenção ou ata de assembleia que aprovou o rateio);

Liquidez: não deixar dúvida em relação ao seu objeto, para tanto tem que constar de forma expressa o valor, e estes valores obrigatoriamente, por força de lei, estar em perfeita conformidade com os aprovados em assembleia;

– Exigibilidade: Os valores precisam estar vencidos, a data de vencimento, via de regra, está prevista na convenção e sua alteração deverá ser realizada em assembleia.

IV) Documentos Necessários para Instrução do Processo de Execução de Cotas Condominiais – Kit Execução

1. O título executivo, que neste caso são os boletos e atraso;

2. Convenção, atas que foram aprovadas as despesas, que alteraram a data de vencimento das cotas e de eleição do síndico do mandato atual;

3. Certidão de Ônus Reais;

4. O demonstrativo de débito atualizado até a data da propositura da ação.

Deve constar no demonstrativo o nome completo do devedor, o índice de correção monetária adotado, a taxa de juros de mora aplicada, o termo inicial e final da correção e dos juros aplicados.

V) Cotas Vincendas na Ação de Execução de Cotas Condominiais – As parcelas vencidas no curso da ação podem ser incluídas na ação??

O art. 323 do CPC/2015 prevê que na ação que tiver por objeto cumprimento de obrigação em prestações sucessivas, essas serão consideradas incluídas no pedido independentemente de declaração expressa ao autor e serão incluídas na condenação enquanto durar a obrigação, se o devedor no curso do processo, deixar de pagá-las ou de consigná-las.

Em que pese o artigo 323 do CPC, citado no parágrafo anterior, se referir ao processo de conhecimento, o parágrafo único do artigo 771 do CPC/2015, admite aplicação de forma subsidiária nas execuções de título executivo extrajudicial das disposições concernentes ao processo de conhecimento.

Posicionamento do STJ.

AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL – AÇÃO DE EXECUÇÃO DE COTAS CONDOMINIAIS – DECISÃO MONOCRÁTICA QUE DEU PROVIMENTO AO RECLAMO. INSURGÊNCIA DA PARTE EXECUTADA. 1. Segundo o entendimento jurisprudencial consolidado por este Superior Tribunal de Justiça, “as verbas condominiais decorrem de relações jurídicas continuativas e, por isso, devem ser incluídas na condenação as obrigações devidas no curso do processo até o pagamento”. (REso 1548227/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 07/11/2017, DJe 13/11/2017). Precedentes. 2. Agravo interno desprovido.

(STJ – AgInt nos EDcl no REsp: 1803465 RS 2019/0071521-4, Relator: Ministro MARCO BUZZI, Data de Julgamento: 23/09/2019, T4 – QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 26/09/2019).

Esse entendimento tem em sua base os princípios da efetividade e da economia processual, dessa forma evita-se o ajuizamento de novas e novas execuções com base na mesma relação jurídica obrigacional.

VI) Multa por Descumprimento de Normas do Condomínio em Ação de Execução – As multas podem ser objeto de execução?

Precisa-se ter claro que as despesas condominiais são de natureza propter rem, pois são encargos relativos ao próprio imóvel, não pode, portanto, ser confundida com a penalidade que é de natureza pessoal e é imposta em função de infração condominial cometida pelo comportamento do condômino.

PROCESSO CIVIL. EXECUÇÃO. DESPESAS CONDOMINIAIS. EMBARGOS À EXECUÇÃO JULGADOS PROCEDENTES PARA EXCLUIR MULTA POR DESCUMPRIMENTO DAS NORMAS DO CONDOMÍNIO. CABIMENTO. CRÉDITO DECORRENTE DE INFRAÇÕES QUE NÃO SE ENQUADRA NA NATUREZA ATRIBUÍDA PELO LEGISLADOR ÀS DESPESAS ORDINÁRIAS OU EXTRAORDINÁRIAS DO CONDOMÍNIO. NÃO CONFIGURAÇÃO DE TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL. RECURSO IMPROVIDO. 1. Os incisos VIII e X do art. 784 estabelecem como títulos executivos extrajudiciais “o crédito, documentalmente comprovado, decorrente de aluguel de imóvel, bem como de encargos acessórios, tais como taxas e despesas de condomínio” e “o crédito referente às contribuições ordinárias ou extraordinárias de condomínio edilício, previstas na respectiva convenção ou aprovadas em assembleia geral, desde que documentalmente comprovadas”, não se enquadrando nessas hipóteses, portanto, a multa por descumprimento das normas condominiais, que não são contribuições ordinárias nem extraordinárias, nem consectários legais de tais contribuições, mas penalidades. 2. Recurso improvido.

(TJ-SP 10466676520168260002 SP 1046667-65.2016. , Relator: Artur Marques, Data de Julgamento: 31/07/2017, 35ª Câmara de Direito Privado, Data da Publicação: 01./08/2017).

AGRAVO DE INSTRUMENTO – CONDOMÍNIO EDILÍCIO – EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL – Cobrança de multas por infração às normas condominiais Débito de natureza pessoal, que não se confunde com despesa condominial ordinária – Impugnação acolhida para determinar o levantamento da penhora – Bem de família – Decisão mantida – Recurso desprovido.

(TJ-SP – AI: 20491513720198260000 SP 2049151-37.2019.8.26.000, Relator: Melo Bueno, Data de Julgamento: 31/05/2019, 35ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 31/05/2019).

Entretanto, existe corrente que entende que se houver na convenção previsão da multa por descumprimento das normas do condomínio, esta, em função dos requisitos previstos no inciso X, do artigo 784 do CPC, se enquadra na hipótese de título executivo extrajudicial, em que pese sua natureza ser pessoal.

Vejamos:

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL. PRELIMINAR DE NULIDADE AFASTADA. MULTAS POR DESCUMPRIMENTO DAS NORMAS DO CONDOMÍNIO. PREVISÃO NA CONVENÇÃO DE CONDOMÍNIO. CRÉDITO QUE SE ENQUADRA NA NATUREZA ATRIBUÍDA PELO LEGISLADOR ÀS DESPESAS ORDINÁRIAS OU EXTRAORDINÁRIAS DO CONDOMÍNIO. PROCEDIMENTO QUE SEGUIU PREVISÃO DA CONVENÇÃO DE CONDOMÍNIO. IRREGULARIDADES AFASTADAS. RECURSO DESPROVIDO.

1. O art. 784, inciso X, do CPC, estabelece como créditos referentes às contribuições ordinárias ou extraordinárias de condomínio edilício aqueles previstos na respectiva convenção ou aprovados em assembleia geral. 2. Estando a multa devidamente prevista na Convenção de Condomínio, enquadra-se na hipótese de título executivo extrajudicial. 3. Realizado o procedimento conforme normas previstas na Convenção do Condomínio para aplicação da multa, não há que se falar em sem irregularidades ensejadoras da nulidade da autuação.

(TJMG – AC 1.0090.17.001723-1/001 MG. Relator: Adriano de Mesquita Carneiro. Data de Julgamento: 30/09/2019. 11ª Câmara Cível, Data de publicação: 04/10/2019).

Diante do brevíssimo esclarecimento sobre a diferença entre a natureza da despesa condominial e da multa, e também as decisões acima, percebemos que ainda não está pacificado na jurisprudência se a multa por descumprimento às normas do condomínio se enquadram na hipótese de título executivo extrajudicial ou não.

Vejamos que se nos alinharmos a corrente que entende que não se pode atribuir título executivo extrajudicial à multa, em função de sua natureza, ela não poderá compor a planilha de cálculo para ação de execução.

E, caso nos alinharmos a corrente que entende poder ser a multa título executivo extrajudicial, devemos observar os requisitos explorados na jurisprudência acima.

VII) Imóvel Gravado com Alienação Fiduciária

É comum se deparar com condômino inadimplente cujo imóvel esteja alienado fiduciariamente. Nesses casos é importante entender a situação jurídica deste imóvel, e assim desmitificar alguns mitos para uma atuação precisa. Afinal, enquanto uma unidade do condomínio está inadimplente, as outras estão sobrecarregadas custeando sua quota.

Alienação fiduciária é um tipo de garantia e uma modalidade de financiamento onde a propriedade do imóvel é transferida no registro para o nome do credor, porém gravado com a alienação fiduciária até que o fiduciante integralize o valor.

Sobre a cota condominial, a lei 9.514/1917 que disciplina a alienação fiduciária, o parágrafo 8º do artigo 27 é taxativo no sentido de que:

“Responde o fiduciante pelo pagamento dos impostos, taxas, contribuições condominiais e quaisquer outros encargos que recaiam ou venham a recair sobre o imóvel, cuja posse tenha sido transferida para o fiduciário, nos termos deste artigo, até a data em que o fiduciário vier a ser imitido na posse”.

Dessa forma a ação deve ser promovida em face do fiduciante, porém o credor fiduciário deve ser intimado para tomar conhecimento da ação de execução de cotas condominiais.

A decisão dos tribunais superiores, inclusive do STJ, é no sentido de que não há responsabilidade solidária entre devedor fiduciante e credor fiduciário quanto ao pagamento das despesas de condomínio.

Porém, uma vez consolidada a propriedade plena do credor fiduciário, este passa a ser responsável pelo pagamento das despesas condominiais.

Ainda nos tribunais:

[…]o credor fiduciário passa a ser responsável pelo pagamento das despesas condominiais quando da consolidação de sua propriedade plena quanto ao bem dado em garantia[…]”

Vejamos que, precisa-se estar atento para saber se a propriedade plena do credor fiduciário está consolidada, e é necessário que essa informação esteja na Certidão de Ônus Reais, que é um dos documentos essenciais à propositura da ação.

VIII) Execução no Juizado Especial Cível – JEC

Por ocasião da edição do Novo CPC, em 2015, muito se discutiu acerca da continuidade ou não da competência das ações de cobrança de despesas condominiais nos JECs, uma vez que o artigo 275 do antigo CPC, que autorizava este ajuizamento, foi revogado.

Ocorre que o Novo CPC sabiamente estabeleceu em seu artigo 1.063 o seguinte:

Até a edição de lei específica, os juizados especiais cíveis previstos na Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995, continuam competentes para o processamento e julgamento das causas previstas no art. 275, inciso II, da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973.

Ainda temos em vigor o enunciado 9 do FONAJE (Fórum Nacional de Juizados Especiais) que assim estabelece: O condomínio residencial poderá propor ação no Juizado Especial, nas hipóteses do art. 275, inciso II, item b, do Código de Processo Civil.

Logo, pode-se afirmar que os Juizados Especiais Cíveis são competentes para processar e julgar as ações de execução de cotas condominiais.

IX) Conclusão

Após observação de alguns dos temas que envolve uma ação de execução de taxa condominial, se vê o quão é complexa essa ação, quantos temas estão envolvidos e o quanto precisa ser analisado.

É importante o advogado inicialmente entender que é fundamental conhecer o motivo que levou aquele determinado condômino à inadimplência, e tentar ao máximo, sem, contudo, violar a legislação, negociar extrajudicialmente. Pois, sabemos que uma ação na justiça tramita em velocidade diversa à necessidade do condomínio e isso pode comprometer toda uma gestão e levar o condomínio a situações bastante complicadas.

Porém, nem sempre essa negociação extrajudicial é possível, a partir de então não resta dúvida de que a Execução dessa inadimplência é a melhor e mais célere ação para se ingressar no judiciário.

Contudo, é necessário se observar minunciosamente os diversos temas apresentados nesse breve artigo, dentre outros, pois trata-se de ação que inicialmente pode parecer simples, entretanto, não o é, e pode seguir meandros que levará o processo a tramitar por anos afio e até mesmo, a uma improcedência do pedido.

[i] Advogada especialista em Direito Imobiliário e Condominial. Possui mais de 12 anos de experiência na área. Faz parte de uma banca nacional de advogados Experts em condomínio. Atendimento para todos os estados.

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